Monday, February 01, 2016

Oração pelo adiamento da posse de São Paulo pelas Blattodeas


Ò Senhor, não nos bastavam os fantasmas do Teatro Municipal?
Não nos seria suficiente os castigos da poluição, as buzinas intermitentes,
um prefeito desastrado, os engarrafamentos, a falta de água ou seu excesso?
Sei que não podemos parar o progresso;
que vivemos numa época de movimentos implacáveis,
de ventos e fogos que não perdoaram nem mesmo a Estação da Luz.
Mas, será tão pesada nossa cruz
que nem mesmo nos salva os pãezinhos gostosos dos monges de São Bento?
Não serve para nos perdoar
Os pastéis de bacalhau, os sanduíches de mortadela, as sopas, caldos,  as pizzas
e todo o delicioso aparato
que os nossos cozinheiros colocam nos pratos,
os museus, comuns ou estranhos,
o encanto sem tamanho
que Caetano e Tomzé  colocaram em melodias
que louvam os cruzamentos e multidões desajeitadas,
nem as curvas do Copan
ou andar a pé por Tatuapé  
ou temos uma predestinação tão danada
que sempre nos dá uma pena maior do que esperamos?
Perdoai, Senhor, os que negam seus triplexs,
ou que nos roubam, de forma oficial ou não,
em nome de toda a população,
ou, pelo menos, em nome dos deserdados
dos que vagam noiados nos locais
de desespero e sonho de uma pauliceia
onde o desvario tem beleza
ainda que, guardados dos criminosos,
estejamos encaixotados como amebas
em minúsculos compartimentos de apartamentos e casas,
que, como os prédios públicos,
possuem o estilo inodoro dos ferros e vidros frios,
de construções que pecam pelo vazio,
que, no entanto, refletem a beleza do sol e da lua.
Sabemos sim do crime do concreto armado
que levou nossas várzeas para a memória,
mas, Senhor, há um monte de igrejas
que, ainda, guardam tuas glórias
e uma gente humilde, pobre e honrada
que conserva a fé no Teu nome
e que trabalha com um desespero
que somente se explica pela necessidade de sobrevivência
e crê, crê muito em Ti,
quando até parece que pecas pela ausência.
Ò Senhor, que sabemos nós de teus desígnios?
Quem, como nós, criadores de caos, podemos julgar Tuas ações?
Nos perdoa, antes mesmo de rogarmos, pela clemência
que esperamos.
Porém, Senhor, há de nos perdoar pela ousadia,
de dizer que tudo tem limite,
mas, se nos permite,
queremos dizer que já é demais
tamanha punição.
Baratas pela Cardeal Arcoverde, Teodoro Sampaio, catacumbas não!
Livrai-nos, Senhor, das baratas do Cemitério de São Paulo.
Que, pelo menos, nos poupe do impotente asco
desses repugnantes insetos incomodar os mortos e os vivos
nos seus passeios noturnos e matinais.
Não te pedimos mais!
Só que salve o cemitério de São Paulo
das pragas das baratas-
isto, para nós, será uma coisa muito cara,
se, além de todos os males,
não tivermos que suportar as Balattarias
desfilarem impávidas
como se já tivessem tomado conta de avenidas e ruas
de nossa incomensurável metrópole.
Que, se somente elas, irão sobreviver à bomba atômica
que, ao menos, não tomem logo conta
de nossa amada São Paulo.

Ilustração: www.alugueldevansbhmg.com.br

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