Sunday, December 03, 2006

E BORGES, SEMPRE BORGES

1964
I
Ya no es mágico el mundo. Te han dejado.
Ya no compartirás la clara luna
Ni los lentos jardines. Ya no hay una
Luna que no sea espejo del pasado,
Cristal de soledad, sol de agonías.
Adiós las mutuas manos y las cienes
Que acercaba el amor. Hoy solo tienes
La fiel memoria y los desiertos días.
Nadie pierde (repites vanamente)
Sino lo que no tiene y no ha tenido
Nunca, pero no basta ser valiente
Para aprender el arte del olvido.
Un símbolo, una rosa, te desgarra
y te puede matar una guitarra.
II
Ya no seré feliz. Tal vez no importa.
Hay tantas otras cosas en el mundo;
Un instante cualquiera es más profundo
Y diverso que el mar. La vida es corta
Y aunque las horas son tan largas, una
Oscura maravilla nos acecha,
la muerte, ese otro mar, esa otra flecha
Que nos libra del sol y de la luna
Y del amor. La dicha que me diste
Y me quitaste debe ser borrada;
Lo que era todo tiene que ser nada.
Sólo me queda el goce de estar triste,
Esa vana costumbre que me inclina
Al sur, a cierta puerta, a cierta esquina

1964
I
O mundo já não é mágico. Deixaram-te sair.
Já não compartilhas a lua clara
nem os jardins lentos. Já não há
uma lua que não seja espelho do passado,
Cristal da solidão, sol das agonias.
Adeus às mãos e os cenas mútuas
que cercavam o amor. Hoje só tens
a fiel memória e os dias desertos.
Ninguém perde (repetes inutilmente)
Senão o que não tem e que tinha tido,
porém não é bastante ser bravo
aprender a arte do esquecimento.
Um símbolo, uma rosa, se desgarra
E te pode matar uma guitarra.
II
Já não eu serei feliz. Talvez não importa.
Há muitas outras coisas neste mundo;
Um instante qualquer é mais profundo
e diverso do que o mar. A vida é curta
embora as horas sejam assim tão largas,
uma obscura maravilha nos achega,
a morte, esse outro mar, essa outra seta
que nos livra do sol, da lua
e do amor. A felicidade que me destes
e me tomastes deve ser apagada;
O que era tudo não deve ser nada.
Só me resta o gozo de estar triste,
Este vão costume que me inclina
ao Sul, para certa porta, para certa esquina.

1 comment:

Lia Noronha &Silvio Spersivo said...

Silvio:Borges...trabalha com o que a estrutura tradicional do conto...simplesmente profundo.
Amei!
Beijos literários pra vc.